27 março, 2011

Especificação, Comunicação e “Isto não é uma mancha, é arte!”

 

a) Há mais de uma forma de descrever algo: “Isto não é uma mancha, é arte!”. (MetaCrap)

Sempre existe e existirá confusão na hora de avaliar um ponto de problema. Principalmente se esse problema ou ponto depender de mais de uma pessoa e o pior, que essas pessoas tenham que conversar para chegar a um ponto comum.

E entenda, nesse momento defina-se por problema qualquer informação que está de posse de alguém, seja esse alguém o especificador ou o entrevistado.

Transmitir uma informação é um processo muito mais complicado do que parece.

As pessoas partem do princípio do pressuposto ou de que alguém sabe aquilo que ela está pensando ou está “alinhada” a transmitir. E não é assim.

Canso de ver reuniões de alinhamento, ou frases do tipo: “precisamos ajeitar ou azeitar isso”. OU frases ainda mais nocivas, no papel de entrevistador: “Pqp como vc é chato, não entende o que estou dizendo, será que você é burro?” ou ainda “Você me faz sentir burro, pois não consigo explicar o que você tanto pergunta...” e sou explicito em informar – não, ninguém é burro, a comunicação é complicada.

O alinhamento e o ajuste necessários são dolorosos e muito, mas muito trabalhosos para todas as partes. Entrevistador e entrevistado.

À primeira vista, o entrevistado, deve ter em mente que o entrevistador vai perguntar, de várias maneiras, a mesma coisa para ter certeza, o mais próximo da verdade (e veja que não existe uma verdade absoluta), sobre todos os aspectos daquilo que está em questão para chegar mais perto da certeza, nunca certa, que pegou os principais pontos do conhecimento ou da informação que o entrevistado está tentando passar.

Imagine o seguinte, como certificar-se que a informação é clara: avaliando. Como se avalia? Perguntando. Como se verifica se tudo foi feito corretamente. Avalia-se novamente. Perguntando.

Obter um detalhe ou informação é muito mais complicado do que parece, vamos a um exemplo prático:

O que é uma aliança? – Responda mentalmente e anote sua resposta.

Alguma delas encaixa-se perfeitamente a uma das abaixo?

1    pacto ou tratado entre indivíduos, partidos, povos ou governos para determinada finalidade
2    união, ligação pelo matrimônio
3    Derivação: por metonímia.
     anel que simboliza noivado ou casamento
4    união harmoniosa de coisas diferentes entre si
5    liga de metais
6    Rubrica: religião.
     nas Escrituras Sagradas, iniciativa de Deus de fazer um pacto com indivíduos ou com um povo
Locuções
a. de palavras
Rubrica: lingüística.
argumento de dois termos contraditórios que, justapostos, podem ser interpretados como metáfora (p.ex.: diz o povo: "devagar também é pressa")
Etimologia
fr. alliance (1160) de allier (1100), do lat. alligáre, de ligaráre; ver lig-; f.hist. sXV aliança, sXV allyança
Sinônimos
ver sinonímia pacto e antonímia de desinteligência
Antônimos
ver sinonímia de desinteligência
Homônimos
aliança(fl.aliançar)

Sinceramente “duvideodó” que a sua frase foi exatamente uma dessas, por vários motivos: vivência, experiência, tempo ou mesmo preguiça.

Você escreveu, se é que escreveu do jeito que especifiquei, isso como: anel ou algo muito próximo.

Agora, imagine que o exemplo foi de algo tangível de conhecimento que já está no inconsciente coletivo, que todos sabem por algum motivo o que é uma aliança.

Pergunte para uma criança de 3 anos o que é um aliança.

Provavelmente ela não saberá o que responder ou inventará uma resposta, pois, na maioria das vezes, buscamos por referencia o conhecimento que está implícito e o implícito não se aplica na transmissão de uma informação.

“As conversas sempre se desenvolvem com base na concordância. Se logo de inicio não concordamos tacitamente que o açúcar é substância comestível, então não poderemos conversar sobre o fato de que as crianças adoram açúcar. A partir dessa base de concordância passamos a reiterar as diferenças.” (DAVID, 2007 p. 207)

E para concordamos em algo, apenas se chegarmos a um ponto de argumentação comum. E tudo isso é um problema muito grave na hora de especificar um determinado sistema. É aquele momento que o chefe fala: “faz assim”, mas ele não vai lá e faz.

Será que o jeito de fazer algo sempre é igual? Duvido de novo.

Um trecho muito interessante que ilustra perfeitamente essa disputa entre entender o que esta implicitado dentro de uma determinada informação segue abaixo:

“O filósofo alemão Martin Heidegger sempre foi considerado uma pessoa difícil de compreender, mas o que ele diz sobre significado faz sentido. O que significa um martelo? Se eu não souber que é uma ferramenta para pregar pregos, não saberei o que um martelo é.

Mas se todos souberem que serve para pregar pregos, continuarei sem saber realmente o que é um martelo.

Preciso saber no mínimo, que pregos são cavilhas de metal usadas para pregar madeira. Mas minha compreensão de um martelo chega apenas até ai. Sei também que a madeira é extraída de árvores, que árvores são plantas que crescem nas florestas, e que as plantas estão enraizadas na terra e crescem em direção à luz do sol. Para compreender o que é um martelo – não de forma abstrata, mas quando o agarramos literal ou figurativamente – é também preciso compreender que as arvores se transformam em toras de madeira porque temos uma economia que paga pessoas para executarem o trabalho.

E empunhar um martelo significa compreender que os seres humanos têm propósitos porque temos necessidades, pois não somos deuses. E também lembrar o som que um martelo faz quando atinge um prego, e talvez o cheiro que a placa de madeira exala em resposta. Tudo isso, diz Heidegger, faz parte de nossa compreensão de um martelo.

O significado de determinada coisa é proporcionado pela rede de significados implícitos pelos quais chamamos mundo.

Heidegger representa uma visão tanto familiar como não familiar de um significado. É familiar porque quando falamos sobre o significado de um evento, em geral nos referimos à maneira como esse evento se enquadra em um contexto mais amplo.

Não é familiar porque com muita frequência pensamos nas palavras como sons ou escritos que tem significado no sentido de que podemos procurar uma definição no dicionário.

Mas procuramos por uma definição quando estamos realmente sem saber. Na maioria das vezes, quando ouvimos uma palavra, não a traduzimos por uma definição.

Não transformamos cada “alô” em “n., um cumprimento comum” – mas ouvimos seu som, sua ressonância, sua intenção e suas conexões.

Entretanto, tudo isso está implícito, e é por isso que parece estranho e exagerado quando Heidegger relaciona um martelo ao Sol e a economia. Entretanto, acho que seu argumento está certo: a rede implícita de relacionamentos fornece às coisas de nosso mundo seu significado.” (DAVID, 2007 pp. 171-172)

Assim, sempre que você tentar escrever um programa e se estressar com o entrevistador ou o programador que foi o responsável pense no seguinte: NINGUÉM PENSA IGUAL PORRA!

Não é obrigação de ninguém saber o que o outro está dizendo, e quando você entrega um produto que é uma transcrição do conhecimento de outra pessoa, você precisa sim perguntar e reperguntar. Encher o saco se for preciso pois tudo está ali.

A sempre mais de uma forma de descrever algo, e isso é um problema linguístico, então não se culpe por perguntar. Pergunte, faça seu processo mental e repergunte para ver se você compreendeu. Se tudo sempre levar ao mesmo destino quer dizer que você está próximo ao entendimento.

E você, só vai entender de verdade no momento que precisar aplicar aquilo que aprendeu.

 

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